Financiamento da Formação (1) – Óptica da Procura

No ano de 2002, somente 11,8% das empresas investiu na formação dos seus recursos humanos. Este resultado, que consta do estudo sobre “Práticas de Financiamento da Formação em Portugal”, publicado pelo IQF- Instituto para a Qualidade na Formação, mostra claramente que a formação só é uma opção estratégica para um número muito reduzido de empresas nacionais .

No entanto, esta situação é ainda mais preocupante no caso das empresas com 1 a 9 trabalhadores em que esta taxa é de 7,1%, enquanto que nas empresas com mais de 250 trabalhadores é de 46,4%.

Por sectores de actividade, o da Electricidade, Gás e Água com 33,3% apresenta a melhor taxa de empresas com formação, enquanto que o sector da Educação apresenta a pior taxa com 7,9%. Este resultado, pelo seu significado, deveria merecer uma análise complementar no sentido de se conhecerem as razões de tal posicionamento.

Na análise feita às empresas que não realizaram formação, o estudo obteve alguns resultados que merecem especial atenção. O primeiro, tem a ver com o facto de mais de metade (53,4%) das empresas ter referido, como justificação, que a qualificação dos seus trabalhadores satisfaz as necessidades de competências da empresa.

Isto quer dizer que, mais de metade das empresas não tem consciência das necessidades de formação dos seus trabalhadores, a que acresce o facto de 75,7% das empresas sem formação declararem que não tencionam realizar formação nos próximos 2 anos. Quando a Europa aposta fortemente numa estratégia de aprendizagem ao longo da vida, em parte para colmatar à elevada taxa de depreciação das competências dos trabalhadores, característica desta fase de transição para a emergente sociedade do conhecimento, a fraca aposta das empresas nacionais na formação e as justificações que apresentam, traduz uma cultura empresarial sem visão estratégica, a que se associam problemas estruturais, como a pequena dimensão das empresas, a reduzida capacidade financeira e uma logística deficiente.

No contexto de forte competitividade existente, quer a nível nacional como global, é necessário implementar medidas no sentido de levar as empresas nacionais a considerar a formação como uma opção estratégica para a competitividade.

Nesse sentido, é urgente regulamentar as novas disposições do código de trabalho relativas à formação dos trabalhadores, de modo a permitir integrar a formação numa estratégia de desenvolvimento de recursos humanos da empresa.

Perante os desafios da competitividade, as empresas nacionais terão dificuldades acrescidas enquanto se verificar que 40,5% não realiza formação porque considera que esta não faz parte das actividades da empresa.

As empresas sem formação apontam, também, a falta de informação sobre o mercado da formação (12,4%) como justificação, o que não deixa de ser um resultado significativo e vem confirmar conclusões de outros diagnósticos que referem a falta de eficácia do sistema de informação sobre a formação.

No caso das empresas com formação, o estudo apresenta mais 2 resultados que merecem destaque. Um tem a ver com a melhoria da qualidade dos produtos e serviços que é indicada pelas empresas como a principal razão para terem realizado formação.

O outro resultado de destaque, é o facto de mais de metade dos beneficiários da formação possuírem já os níveis mais altos de qualificação, o que traduz uma distorção no acesso à formação. Esta situação, que reflecte a forte procura de formação pelos níveis de qualificação mais elevados e a reduzida procura pelos outros níveis, deverá ser objecto de atenção especial, tendo em vista garantir a coesão social num mercado de emprego muito competitivo. Ainda na óptica da procura, o estudo analisa o mercado da formação e conclui que as empresas com formação não dispõem, na sua maioria, de competências próprias para desenvolver a sua formação, quer ao nível das instalações, dos recursos técnico-pedagógicos e dos formadores, ou seja, 82% dessas empresas recorre a fornecedores externos para a execução da formação.

No entanto, os resultados obtidos para os outros domínios do ciclo de desenvolvimento da formação, como o diagnóstico e a concepção, variam entre 22,4% e 35,9%, o que levanta a questão de saber se estes valores se devem ao facto das empresas terem essa capacidade interna, ou se pelo contrário, se deve ao facto de não serem considerados domínios importantes e, portanto, ou não são realizadas ou são desenvolvidas de modo rudimentar.

Ao analisar o tipo de fornecedores das empresas com formação, o estudo constata a preferência pelo recurso a empresas de consultoria/formação (63%), a associações profissionais (26%) e a fornecedores de equipamentos (22%), assim como o distanciamento das universidades e politécnicos (9%), das escolas profissionais (5%), dos centros tecnológicos (5%) e dos centros de formação do IEFP (10%).

No tocante à organização da formação nas empresas, as formas dominantes são a formação presencial (90%) e a formação em contexto de trabalho (50%). De referir que, quando se trata de formação a distância ou de e-learning, o peso das empresas que considera que os trabalhadores devem financiar a sua formação é mais elevado.

Apesar do número reduzido de empresas com formação, mais de 80% refere que vai continuar a realizar formação, o que contrasta com a situação das empresas sem formação, em que 75,7% referiu que não pretende realizar formação nos próximos 2 anos.

Por último, no tocante ao financiamento da formação, há 2 aspectos a destacar. O primeiro, é o facto de 75% das empresas sem formação pretender fundos públicos para realizar formação, enquanto que nas empresas com formação só 21% recorre a fundos públicos, e 87% recorre a fundos próprios.

O segundo aspecto, é a confirmação de uma distorção no acesso ao financiamento da formação, pois são as grandes empresas, geralmente melhor preparadas para assumirem os custos da formação, que mais beneficiam dos fundos públicos.

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