Durante alguns anos Portugal teve uma paixão pela educação. A seguir, o país teve uma paixão pelo défice orçamental e, desde há dois anos, vive a paixão pela tecnologia e pelo conhecimento. No ciclo actual, para relevar a importância da paixão, criou-se o cargo de “Senhor Lisboa” para coordenar as acções nacionais do Plano Tecnológico e da Estratégia de Lisboa, a qual está na origem da designação do cargo.
À primeira vista, parece que desta vez a paixão vai dar frutos e que Portugal se vai transformar num país moderno e tecnológico, por obra e graça do “Senhor Lisboa”. Mas, a verdade é que não basta apresentar um plano ao país e criar um cargo para desenvolver, a nível nacional, uma “cultura tecnológica” que promova a adaptabilidade das organizações e dos trabalhadores numa sociedade baseada na tecnologia e no conhecimento. Um inquérito recente confirma esta preocupação, ao constatar que os portugueses não sabem o que é a Estratégia de Lisboa e que o Plano Tecnológico é muito pouco conhecido. Somente as medidas mais mediáticas do Plano são conhecidas de modo superficial, sem uma visão dos objectivos estratégicos e dos seus benefícios para Portugal e para os portugueses.
Pelo contrário, a maioria dos portugueses sabe o que se passa com a Selecção Nacional e quando são chamados à acção respondem prontamente, como ainda recentemente aconteceu em Coimbra, com um estádio lotado e um ambiente festivo que transformou um jogo num verdadeiro espectáculo desportivo.
Qual o segredo? Também no caso da selecção, durante muitos anos tivemos planos ambiciosos mas nunca os conseguimos concretizar com sucesso. Mas, com o Euro 2004 em Portugal tudo mudou, e o Mundial 2006 consolidou a mudança. O Plano e a Estratégia definidas conseguiram mobilizar os portugueses em torno de um projecto nacional: levar a Selecção Nacional a conquistar os primeiros lugares das principais competições de futebol.
Pela primeira vez, foi possível observar uma mobilização nacional que se traduziu nas bandeiras nacionais afixadas por todo o lado, desde janelas e portas de casas a antenas e vidros de viaturas, no colorido vestuário em tons verde e vermelho e no ambiente de festa que acompanhava a selecção para todo o lado.
Aproveitando o fenómeno, as televisões passaram a dar uma cobertura nunca vista a todos os passos da selecção, fazendo directos por tudo e por nada, e transmitindo as mais variadas iniciativas de apoio popular, nomeadamente das comunidades emigrantes que também corporizaram a forte mobilização nacional. É evidente que pode sempre dizer-se que tal se deve ao facto do futebol ser um negócio que move milhões e que mobiliza de multidões. É verdade. Mas, não deixa de ser uma “lição” de mobilização dos portugueses para um projecto nacional, independentemente de gostarmos ou não de futebol, ou de este ter, para muitos, uma imagem negativa.
E é uma “lição” principalmente para o “Senhor Lisboa” que deveria ter por missão levar Portugal a conquistar os primeiros lugares dos campeonatos europeus e mundiais de tecnologia e do conhecimento. A “Lição da Selecção” tem vários aspectos que merecem reflexão. Senão vejamos. Em primeiro lugar, na Selecção, contratou-se o seleccionador que tinha ganho o campeonato do mundo. Depois construiu-se uma equipa com os melhores, a qual foi reforçada com jogadores estrangeiros que entretanto se naturalizaram. Os jogadores da selecção, e aqueles que tinham potencial para virem a ser seleccionados, foram sempre acompanhados no seu percurso, mesmo os que jogavam fora do país. A selecção inclui sempre jogadores que jogam no país e no estrangeiro, o que constitui uma mais valia competitiva. O plano de trabalho reforçou o espírito de equipa, sendo evidente a forte coesão do grupo em volta do líder, o seleccionador nacional.
A estes factores, acresce outro que assumiu, também, um papel fundamental na mobilização dos portugueses: os media nacionais. De facto, nos últimos anos, os media alargaram as suas redacções de desporto e passaram a dedicar o tempo de antena de maior audiência à cobertura do fenómeno desportivo.
Contudo, não deixa de ser curioso, que esta situação também se verifique nos media de serviço público. Pelo contrário, estes media não possuem redacções com jornalistas especializados nas áreas da educação, da tecnologia e do conhecimento, apesar de estratégia de desenvolvimento de Portugal assentar no Plano Tecnológico e na Qualificação dos Portugueses. E este é um paradoxo e um constrangimento que urge ultrapassar rapidamente, pois enquanto os media nacionais não integrarem uma visão de educação, de cultura e de conhecimento e uma ideia de desenvolvimento para Portugal, dificilmente se conseguirá mobilizar o país e os portugueses para o crescimento e a competitividade.
Para terminar, como estamos com o Plano Tecnológico? Na passada semana o “Senhor Lisboa” anunciou que a taxa de realização é de 89%. Quer isto dizer que já construímos uma rede (selecção) nacional de tecnologia e de conhecimento, com a participação dos melhores talentos que trabalham em organizações de referência nacionais e internacionais, com a generalizada cobertura dos media, e que já conquistamos os lugares de topo do ranking do desenvolvimento e da coesão social?
Boas Festas e Feliz 2007.
“O meu pai ensinou-me que há dois tipos de pessoas. As que trabalham e as que tentam ficar com os louros. Ele aconselhou-me a tentar ficar no primeiro grupo. Há menos competição.”Mahatma Gandhi
Publicado na Webzine do NESI
Etiquetas: coordenador plano tecnologico, estratégia lisboa, qualificação, selecção nacional, senhor lisboa
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