Nos meus tempos de escola aprendi que o mundo era redondo. Para vincar bem essa ideia, como os mapas de estudo eram planos, as salas de aula tinham sobre a mesa do professor um globo com o atlas. Agora, passadas quatro décadas, acabo por “descobrir” que, afinal, o mundo é plano. Na verdade, o globo não se achatou nem ficou plano pois a metáfora utilizada por Thomas Friedman visa apenas explicar as consequências da globalização, do offshoring e da terciarização da economia.
Para Friedman o mundo plano é uma grande aldeia global onde as actividades são organizadas horizontalmente e os pequenos têm a oportunidade de ser grandes. Neste contexto, em que as hierarquias se achatam, qualquer pessoa tem a possibilidade de colaborar e concorrer a nível global com outras pessoas pelo que, nesse sentido, considera que o mundo é plano.
Esta mudança é muito relevante, pois quando antes se falava de colaboração e competição a nível global estávamos a falar de grandes empresas ou organizações ou de países. Segundo Friedman, hoje o mundo é plano no sentido em os países menos desenvolvidos, como a China e a Índia, começam a competir nos mesmos mercados que os países mais desenvolvidos. Na sua opinião, a construção de uma única rede global interligando todos os centros de conhecimento do planeta contribuiu decisivamente para este fenómeno do mundo se estar a tornar plano.
Contudo, se é verdade que a rede de conhecimento global tem sido um factor de inovação e de desenvolvimento dos países e das organizações e tem contribuído para um mundo mais plano, será que o achatamento também está a ocorrer no mundo da educação e da formação. Será que podemos dizer “a escola é plana”?
Se observarmos o que se passa dentro da escola, a resposta é não. A escola não é plana pois basta entrar numa sala de aulas para perceber que são verdadeiras montanhas onde os professores, o currículo e os conteúdos estão no alto da hierarquia e os estudantes estão no fundo. Recorrendo a Paulo Freire, pode dizer-se que a concepção bancária continua bem presente com os conteúdos a serem depositados pela força da gravidade nas cabeças dos estudantes. David Warlick também questiona o fluxo de informação de cima para baixo ao afirmar que na perspectiva da sociedade da informação os estudantes têm um nível de literacia digital superior ao dos seus professores. Hoje, quando entram na escola, os jovens já viram mais de 4.000 horas de televisão. Se acrescentarmos depois as horas de jogos de computador e de Internet temos uma ideia clara do nível de literacia digital do estudante actual. Marc Prensky designa esta geração por “nativos digitais”, os quais pensam que tudo é “clicável” incluindo os pais e, obviamente, os professores. Provavelmente, todos sabemos o que é um texto “clicável”. Mas, o que é um professor “clicável”? O que é uma escola “clicável”?
Por outro lado, se observarmos o que se passa fora da escola, a resposta é sim. A escola é plana porque na sociedade em rede a aprendizagem se faz cada vez mais fora da escola, através do acesso às redes de conhecimento, do trabalho colaborativo e da partilha em rede com outras pessoas ou grupos. Em qualquer dos casos, a aprendizagem (informal e não formal) decorre num espaço plano com as mesmas condições de acesso para todos quer sejam estudantes ou professores.
A escola é plana, ainda, porque o acesso à educação e à formação se banalizou e, neste sentido, a escola está mais plana e, numa óptica social, mais igualitária.
“Quanto mais aumenta o nosso conhecimento, mais evidente fica a nossa ignorância.” John Kennedy
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17 Julho, 2007 às 9:27 pm |
Como professora posso dizer que tenho tentado implementar nas minhas aulas estratégias que tornem a sala de aula plana no sentido em que é usado no seu post). Mas não é fácil primeiro porque a nossa sociedade não é plana. Depois porque, os próprios alunos resistem a ser retirados da base. Vou dar um exemplo muito simples. Para todos eles o contacto com as novas tecnologias é natural e banal. Mas, se tento que eles me transmitam algum do seu saber, olham com desconfiança e resistem.