Capital de alto risco

No último Encontro COTEC Europa, que teve lugar em Lisboa no passado mês de Julho, o governo anunciou a criação de um fundo de capital de risco de 100 milhões de euros (cerca de 20 milhões de contos), para apoio às PME portuguesas.

Depois de anos a ouvir dizer que Portugal tem dos mais baixos níveis de I&D (Investigação e Desenvolvimento), assim como de registo de patentes, e que as PME portuguesas não são inovadoras, fiquei a pensar se há mercado para tantas iniciativas de capital de risco. Basta consultar a rede PME Inovação da COTEC Portugal, com pouco mais de 50 empresas, para ficar com a sensação de que a crescente oferta de capital de risco já deve exceder a procura.

A este propósito, convém lembrar Manuel Castells ¹, o investigador que durante anos estudou o fenómeno em Sillicon Valley, o berço do capital de risco. Segundo Castells o capital de risco surge como resposta a uma forte procura de investimento por parte das start-ups inovadoras que surgiam a um ritmo elevado na década de 90. Essas start-ups tinham um alto risco de mortalidade, na ordem dos 35%, o que constituía um forte obstáculo à obtenção de financiamento junto das entidades financeiras, as quais desconheciam os modelos de negócio e consideravam o risco exagerado.

Neste contexto, surgiram os capitalistas de alto risco dispostos a investir em start-ups inovadoras na expectativa dos elevados lucros proporcionados pela valorização em bolsa de muitas dessas empresas. Estes investidores que conheciam o sector e dispunham de elevada capacidade de investimento foram os criadores das empresas de capital de risco. Estas empresas além de assegurarem o financiamento trabalhavam junto com as start-ups orientando os seus projectos empresariais. Contudo, nem sempre os investimentos eram bem sucedidos pois cerca 4 em cada 10 fracassavam. No entanto, o lucro conseguido com as start-ups que tinham sucesso gerava rentabilidades muito acima do mercado. Ao alto risco do investimento correspondia um retorno muito alto (acima do mercado).

Mas, como se obtinham tão altas rentabilidades num curto espaço de tempo? Para conseguir financiamento, as start-ups vendiam os seus planos de negócios às empresas de capital de risco. Com o capital de risco os empreendedores criavam a empresa, contratavam talento e desenvolviam todos os esforços para lançar uma Oferta Pública Inicial na bolsa de valores. Nessa operação, o objectivo era gerar elevadas expectativas sobre o sucesso da empresa no futuro. Se a valorização das acções na OPI fosse um êxito, a empresa utilizava o montante obtido na bolsa para obter mais capital e começar a sua actividade em pleno. Desse modo, a empresa atraía o interesse do mercado e acabava sendo adquirida por uma empresa maior.

Nesta altura, é oportuno perguntar se é esta a realidade do capital de risco em Portugal? Onde estão as start-ups com modelos de elevado crescimento que combinam inovação tecnológica, inovação empresarial e financiamento com base em expectativas?

De facto, sem um mercado de capitais para as PME inovadoras, há oportunidades muito mais lucrativas para os investidores do que as start-ups de base científica e tecnológica. Talvez por esta falta de investidores privados se compreenda que em Portugal se faça a apologia do capital de risco invocando as virtudes do modelo americano, cuja base é o investimento privado, e depois se crie um fundo de capital de risco de génese pública, esquecendo que o capital de risco nasceu para investir em empresas de alto risco e obter um retorno muito alto e que esta abordagem não cabe ao sector público.

Mas, como em Portugal as entidades de capital de risco investem muitas vezes em empresas tradicionais para obter um retorno que pode ser negativo, talvez se esteja a falar de “subsídio de risco”.

“Eu não sei o que é o sucesso, mas sei o que é o fracasso. Fracasso é tentar agradar a todos.” Sammy Davis Jr.
¹ Livro Galáxia Internet
Publicado no Diário de Notícias da Madeira de 10 de Setembro de 2007

Etiquetas: , , , ,

Deixe uma Resposta

Please log in using one of these methods to post your comment:

Logótipo da WordPress.com

Está a comentar usando a sua conta WordPress.com Terminar Sessão /  Alterar )

Facebook photo

Está a comentar usando a sua conta Facebook Terminar Sessão /  Alterar )

Connecting to %s


%d bloggers gostam disto: