Quem se lembra do que era o trabalho nos portos, em 1970, sabe bem que a operação de carga e descarga de um navio exigia um número muito elevado de trabalhadores e alguns dias de trabalho. Nessa altura, segundo Tom Peters, a operação de descarga de um grande navio exigia o trabalho de 108 homens durante 5 dias. Passadas 3 décadas, em 2000, com a contentorização da carga, a operação de descarga passou a ser feita por apenas 8 homens durante um dia. Feitas as contas, chegamos aquilo que Peters designou o “Factor 98,5” para expressar a eliminação de 98,5% de trabalhadores de colarinho azul.
Hoje, passada mais uma década, a crescente globalização e a introdução de novas tecnologias estenderam este fenómeno a outros sectores de actividade, provocando a destruição em massa de postos de trabalho de colarinho azul. Em Portugal, é raro o dia em que a televisão não nos mostra as consequências deste “factor” em diversos sectores da indústria, com um impacto nefasto na subida galopante do desemprego e na degradação da coesão social.
Acresce que, apesar de durante algum tempo se ter acreditado que este fenómeno só afectava os trabalhadores de colarinho azul, são cada vez mais evidentes os sinais de que se está a passar o mesmo com os trabalhadores de colarinho branco, cujos empregos estão a sofrer um processo de reconfiguração que deverá atingir, segundo alguns estudos, cerca de 80% dos empregos nos próximos 10 anos.
Para Peters “o emprego de colarinho branco, tal como o conhecemos, está morto”. A leitura dos relatórios publicados recentemente pela OCDE permite comprovar que a mudança já está em curso e está a ser dolorosa. Mas, o que é mais preocupante é que ninguém parece capaz de descobrir o medicamento para aliviar a dor e o desespero dos mais de 600 mil desempregados em Portugal. Mais, não há botão de stop. Entretanto, o “Ground Zero” do emprego continua a crescer.
Publicado no Diário de Notícias da Madeira em 17 de Outubro de 2010.