A Lei de Murphy na Formação

Nos últimos meses Portugal tem vivido a obsessão da OTA. Depois das obsessões do défice orçamental e do Plano Tecnológico, agora só se “debate” o investimento no novo aeroporto, que uns defendem seja na OTA e outros noutra parte qualquer.

Provavelmente, e tudo aponta nesse sentido, dentro de pouco tempo haverá uma nova obsessão, o TGV, ou para quem não gosta de siglas, o comboio de alta velocidade. Mais uma vez, sem necessidade de ler a bola de cristal, se adivinha a quantidade de estudos que irão ser esgrimidos pelas partes em confronto para justificar tanto o investimento como o trajecto das linhas.

Não vou questionar se estes investimentos são necessários. Não conheço os dossiers e também não tenho preparação para os analisar. Mas, do que ouvi nos debates uma coisa é certa: quanto mais informado mais dúvidas tenho. Talvez seja incapacidade minha, admito.

Há, no entanto, um investimento sobre o qual não tenho dúvidas. A necessidade de Portugal investir no seu capital humano. E, nesta matéria, não há debate. O silêncio é tal que a palavra de ordem parece ser: o segredo é a alma do desenvolvimento do capital humano.

Senão vejamos. No caso do novo aeroporto, a sociedade portuguesa organizou-se e mobilizou-se para o debate com o argumento de que o investimento de 3,1 mil milhões de euros é muito elevado, pelo que importa assegurar que não serão desperdiçados. No caso do comboio de alta velocidade, esta preocupação deverá ser maior pois o investimento na linha Lisboa-Porto será de 4,5 mil milhões de euros.

Se nos lembrarmos que o investimento no capital humano vai ultrapassar o astronómico montante de 6 mil milhões de euros ¹), o dobro da OTA e mais 50% do que o TGV, como se explica a falta de mobilização dos parceiros sociais, das associações empresariais, dos sindicatos e o silêncio dos seus líderes?

A situação é ainda mais incompreensível quando todos conhecem bem as consequências de 20 anos de desperdício nos financiamentos do Fundo Social Europeu, de tal modo que o diagnóstico continua o mesmo: baixa qualificação dos portugueses e um país refém da baixa produtividade e da fraca competitividade.

Contudo, a perplexidade aumenta quando o discurso de todos é “não podemos desperdiçar a última oportunidade de Bruxelas”. Então, em que ficamos? Não queremos repetir os erros do passado mas não se debate a qualificação dos portugueses? No entanto, a qualificação é simplesmente o principal desígnio de Portugal para os próximos 7 anos. Pelo contrário, nem a OTA nem o TGV constam do QREN, Quadro de Referência Estratégico Nacional, como desígnios nacionais.

Não quero ser fatalista, mas parece que Portugal segue a Lei de Murphy “se alguma coisa puder correr mal, correrá mal”, pois a atitude dos portugueses face à formação tem sido “sorria, amanhã será sempre pior”. Mas, com esta filosofia e a ausência de um debate nacional sobre a qualificação dos portugueses, pode transformar-se uma oportunidade com tudo para correr bem em mais uma oportunidade que correrá mal.

“Quando todos pensam do mesmo modo, então ninguém está pensando.” George Patton
¹) Cerca de 700.000 contos por dia útil

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